EUA tentam fechar cerco contra maconha artificial
Proibido nos EUA, pacote de maconha artificial traz
mistura de ervas, acetona e canabinoides artificiais
Os Estados Unidos entram em uma nova fase na luta contra as
drogas nesta semana. Após uma investigação que buscou provas em todo o país
desde o Ano-Novo de 2012, as autoridades devem indiciar três pessoas pela
produção e distribuição de maconha artificial.
“O spice [gíria em inglês para maconha artificial] é bem
popular tanto nos Estados Unidos quanto no Reino Unido há alguns anos. O
relatório de drogas da ONU, que é feito por um escritório bem formal e distante
das ruas, começou a dar destaque para ele no fim da década passada, em 2009,
mas é um fenômeno dos anos 2000” ,
explica o jornalista Tarso Araujo, autor do Almanaque das Drogas, da editora
Leya.
Para driblar a legislação dos EUA, a droga extraída da
planta Cannabis passou a ser também fabricada em laboratórios caseiros com um
processo químico lucrativo e, até então, legalizado. A maconha artificial é uma
mistura feita de ervas, incenso, grama, acetona e canabinoides sintéticos
importados da China e da Índia.
Mas agora, Dylan Harrison, John Shealy e Michael
Bryant, sócios da empresa Mr. Nice Guy, podem ficar até 30 anos atrás das
grades por comercializar mais de cem pacotes com ervas medicinais “turbinadas”
com elementos químicos por semana.
Brecha
Identificados por siglas alfa-numericas, esses químicos eram
permitidos, pois imitavam os efeitos da droga sem trazer na sua composição o
THC (tetrahidrocanabinol) ou outras substâncias psico-ativas proibidas da
maconha. Quando a Justiça descobria qual o canabinoide sintético
comercializado, os fabricantes mudavam a fórmula e vendiam uma nova droga no
lote seguinte, mantendo-se sempre à frente da lei.
“Esses elementos são perigosos porque são mais potentes do
que os canabinoides ‘naturais’ da maconha. Estudos apontam que eles se encaixam
com mais intensidade nos receptores de canabinoides que existem em várias
partes do nosso organismo – do hipocampo ao sistema gástrico, que regula nosso
apetite”, afirma Araujo.
A maconha tem uma sigla menos conhecida, o CBD, mas que faz
um importante contraponto no cérebro das pessoas aos males provocados pelos
canabinoides. “O canabidiol [CBD] é outro componente da planta da maconha, mas
que não traz esses efeitos nocivos, como ataques de ansiedade e esquizofrenia
provocados pelo THC”, explica o neuropsicólogo Paulo Jannuzzi Cunha,
pesquisador do IPq (Instituto de Psiquiatria) do Hospital das Clínicas. “Ele
mimetiza o efeito de relaxamento, por exemplo, mas não chega a trazer o efeito
mais danoso no cérebro que o THC carrega e que causa o ‘barato’ maior.”
A ausência do CBD na substância de laboratório pode explicar
o porquê de a droga ser mais nociva (e preocupante) do que a “original”.
Relatos médicos indicam que os usuários da maconha artificial apresentaram
sérios transtornos psiquiátricos quando não ficavam catatônicos.
“Essas drogas têm dois aspectos que facilitam o uso e atraem
os jovens para o consumo: o acesso fácil e também o fator de risco
desconhecido, que se encaixa no perfil do jovem, que não se importa com as
consequências”, lembra Cunha, especializado em dependentes químicos.
O imbróglio
A Justiça começou a combater o uso descontrolado da maconha
sintética há dois anos, quando um ato proibiu o uso de cinco substâncias
bastante populares, entre elas JWH-018, AM-2201 e HU-210, e, principalmente,
seus análogos.
Mas os advogados dos três empresários de Miami alegam que
eles comercializavam um composto bem diferente, fato que os protegeu até julho.
Mas há dois meses, o presidente Barack Obama baniu todos os tipos de
canabinoides artificiais, enquadrando o grupo de vez.
“UR-144 é um dos componentes estruturalmente diferente das
substâncias banidas e muito difícil de ser enquadrado na lei dos análogos.
Basicamente, eles mudaram uma molécula e a substituíram por um novo grupo
químico. O produto com UR-144 não vai causar euforia, alterar a percepção nem
mexer nas habilidades motoras, e isso não é uma mudança pequena”, alegam
Thomas Wright e Spencer Siegel à imprensa norte-americana.
O escritório da dupla ficou especializada em prestar
assessoria jurídica, ao custo mensal de US$ 3.500, a vários
fabricantes e distribuidores de drogas sintéticas no país. O caso da empresa
Mr. Nice Guy é um emblema contra a fragilidade do sistema jurídico, segundo a
dupla, que não está preparada para entender a questão das drogas sintéticas.
“Além da proibição de novas drogas sintéticas não ter efeito
prático, ela dá condições para o mercado negro. O movimento de proibir essas
drogas gera drogas em que o controle de qualidade é muito baixo e sem testes
clínicos. É um tiro no pé, na minha opinião”, conclui o autor do Almanaque das
Drogas.
Fonte: UOL NOTÍCIAS
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